terça-feira, 6 de julho de 2010

Exposição “ Sentir os laços” – 1999 - Porto

A verdadeira arte opaciza os casos, que porventura são fonte de inspiração ou de origem: rasura-os e ao rasurá-los, transcendo-os.
Se perante um destes quadros apetece perguntar de que falam, o que vêem, o que ouvem estas personagens, como se procurássemos o fio de uma história que nos fosse dado escutar; o significado do todo que marca a pintura de Olga Barbosa, projecta-nos para além dos motivos mais recônditos que a fizeram emergir.
É que os quadros só falam com os quadros, e nesta fala, descoberta que sob o sedimento dos primeiros dizeres acodem em nós, falam em nós de coisas-em-nós: os laços que dizem a cartografia da nossa liberdade enredam-se aqui em arquivos de irremediáveis opressões, de tenazes persistências que a memória conserva, e, agora, supera,reelabora.
Mas não será este um dos sinais da nossa condição e, com ele, de toda a arte?
A menina-retalho-boneca-repasto que denuncia os símbolos do seu devir, é o olhar geométrico da mulher que pode olhar a infância, os seus mitos, a violência e a opressão que teimam em persistir. Ainda que possa sofrer, porque iluminada, mormente por esta pintura de Olga Barbosa, sabe como resistir.

Eugénio Peixoto 1999



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